Blog da Laura Peruchi – Tudo sobre Nova York
NYC

Qual o seu sentimento ao receber uma cantada na rua?

Para responder essa pergunta, não queria falar apenas por mim e pelas minhas experiências. Semana passada, o vídeo acima começou a ser compartilhado nas redes sociais. Tirem um tempinho para assistir – uma moça caminha em silêncio por Manhattan – é, NY! – por 10 horas e registrou todas as vezes em que alguém mexeu com ela (piscadinhas e assobios nem entraram na conta, ok?). Quantas vezes isso já aconteceu com você? Aposto que inúmeras, não? Sem contar aquelas buzinadas, vindo dos motoristas bobinhos que não podem deixar passar a oportunidade de dizer alguma coisa – nem que seja por essa atitude ridícula de buzinar. Sério, tem coisa mais escrota?

Quando eu mudei pra New York, fiquei aliviada ao ver que passava obras sem ouvir nada – coisa praticamente impossível no Brasil. Mas, algum tempo depois, descobri que não estaria livre dessas investidas nas ruas. Desde “good morning my sexy” até o “hello beautiful” até os resmungos inaudíveis. A resposta é sempre a mesma: aquele silêncio e aquela vontade de passar logo pelo indivíduo – quando não sinto o cheiro da encrenca antes e atravesso a rua para evitar algum comentário do tipo.
Na semana passada, compartilhei o vídeo acima num grupo de meninas do qual faço parte, no Facebook, para saber a opinião geral. O resultado foi unânime. Ninguém gosta desse tipo de coisa – a gente se sente vulnerável, com nojo e com aquela sensação de impotência. O mais triste disso tudo é ver que muita gente tem uma visão deturpada da coisa e acha que isso é exagero da nossa parte, que deveríamos agradecer e tomar as investidas como elogios – quando não ficam fazendo aquele tipo de comentário: ah, mas se o cara fosse gato vocês não iam reclamar. Não, não é assim que as coisas funcionam. Não acho que um cara bonito – e olhem, beleza é algo muito relativo – vai ganhar pontos com alguém com esse tipo de abordagem. Até porque só beleza não põe mesa, né? Que adianta ser bonito e abrir a boca pra abordar uma mulher de um jeito desrespeitoso?
Fiquei triste mesmo foi com os comentários no vídeo lá no Youtube. Um monte de machistas criticando, achando um absurdo e ainda falando que oras, agora não se pode nem ser educado e dar bom dia? E daí eu pergunto: será que eles dariam um bom dia assim para outro homem? Possivelmente não. E a questão é tão simples: tudo envolve respeito. Respeito, gente. Mas é só observar as cantadas do vídeo para ter a noção de que a maioria faz esse tipo de coisa só para não perder a oportunidade de mostrar o quanto são “machos” e comer com os olhos com este tipo de gracinha – e não para estabelecer um diálogo. Não há interesse real. Fazem isso porque podem e porque gostam. Porque se acham superiores, sentem-se os gostosões do pedaço.
Comentei com algumas pessoas sobre o vídeo e me perguntaram: mas como ela estava vestida? What? Vejam o preconceito dentro da pergunta. Se ela estivesse usando um decote, ou um vestido, ou uma saia curta, era compreensível? Estava pedindo? É o mesmo argumento do “foi estuprada porque pediu”? Onde está o direito de liberdade de cada um? Pior ainda é saber que por causa de babacas como esses por aí é comum que as próprias mulheres restrinjam seu guarda-roupa para evitar incomodação. No grupo do Facebook onde comecei a discussão muitas relataram ter um cuidado maior com o que vestir – roupa de ginástica é tortura! – para evitar comentários desagradáveis.
Outro fator importante trazido pelo vídeo é que o desrespeito pela mulher não tem lugar. Aposto que muita gente ia falar muito mais se as cenas tivessem sido gravadas no Brasil. Mas, não esqueçam: o vídeo foi feito aqui em New York, cidade grande, moderna, que fica num país de primeiro mundo. Sem contar que havia homens de todas as idades, brancos e negros, de diferentes partes da cidade. Ou seja, não dá pra segmentar. Para vocês terem ideia de como esse negócio é sério, em Paris está rolando uma campanha para ensinar os homens a se comportarem no transporte público. Aqueles velhos comportamentos que se repetem nos espaços públicos em todos os lugares. Desde o assédio até o fato de que os homens têm medo de fechar as pernas. O aviso: “Les testicules ne sont pas en cristal, elles n’exploseront pas.” Ainda no Brasil, semana passada, uma menina de 17 anos foi estuprada por três homens depois de defender uma mulher numa discussão política. As manchetes usam “suposto estupro”, claro. Os comentários questionam o que uma menina de 17 anos estava fazendo na rua sozinha à noite. Claro, só quem não é homem heterossexual sabe que, ainda em 2014, existe toque de recolher. Ironia ou não, na última quinta, o programa “Amor & Sexo” trouxe pedreiros gatinhos no Rio de Janeiro para contar o tipo de cantada que eles passam nas mulheres. O que volta à questão que eu citei anteriormente: como se beleza apagasse o comportamento escroto. Não assisti ao programa, mas li um artigo na internet e preciso dizer que fiquei bem decepcionada. Pra completar, no Irã, autoridades judiciais enforcaram (dia 25/10) uma jovem de 26 anos condenada à morte por matar um homem que a teria estuprado.
O que se faz em momentos como esses? Infelizmente, o medo da maioria é maior do que qualquer vontade de reagir e aí só resta o silêncio angustiante e aquele sentimento horrível de vulnerabilidade. Aí eu me pergunto: até quando?

2 Comentários

  1. Excelente texto, Laura.
    Um amigo comentou sobre esse vídeo no fim de semana e uma outra amiga fez o tal comentário: ela tava de saia curta? Realmente isso está já na mente das pessoas, o que é triste. Confesso que até eu já me peguei pensando assim: olha a roupa daquela menina, depois não querem que mexam com ela!
    Mas isso é coisa que vamos aprendendo, amadurecendo. Respeito é a coisa que eu mais prezo e acho que o mundo está como está por falta dele.
    :*

  2. Demais…é bem verade…a gente não precisa dar motivos nenhum…não precisa estar de roupas curtas ou decotadas…é uma invasão sabe…os homens deveria repensar como tratar as mulheres!!
    Nós não somos objetos…

    Beijocas

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