Blog da Laura Peruchi – Tudo sobre Nova York
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O fechamento da Century 21 e uma reflexão sobre nossos padrões de consumo

Na semana passada, uma das notícias mais comentadas no mundo dos negócios foi o anúncio do fechamento da Century 21. A rede de lojas de departamento existia desde a década de 60, com presença não só em Nova York, mas em outros estados da costa leste dos Estados Unidos. Era uma loja bastante famosa na cidade, que atraía, principalmente, turistas (muitos brasileiros, inclusive). Ganhou até cena no icônico seriado Sex and the City. A Century 21 oferecia acessórios, roupas e calçados, dentre outros produtos, de marcas famosas como Calvin Klein, Michael Kors e Kate Spade – tudo com desconto. A rede anunciou falência depois que as seguradoras negaram um pagamento de resgate. A notícia repercutiu não só aqui, mas entre todos os canais brasileiros na internet – redes sociais e blogs – que falaram sobre o fato. Não é difícil entender, já que qualquer ida à alguma das unidades da loja era garantia de ouvir português. Vi muita lamentação, afinal, isso representa a crise que o mundo vive e continuará vivendo por um tempo – muitos funcionários perderam seus empregos. Mas senti muita tristeza pelo fato de a loja não estar mais aqui para suprir os desejos de consumo de muita gente. E isso me fez refletir bastante sobre esse cenário.

Faz tempo que eu observo esse comportamento de consumo durante viagens. E, que fique claro, a minha ideia aqui não é condenar ninguém. Já estive nesse lugar onde a gente sente uma ansiedade maravilhosa e incontrolável pelas compras no exterior e estou bem longe de viver uma vida mega minimalista. No caso do Brasil, muito se deve a não existir acesso a algumas coisas e pela competitividade dos preços no exterior (talvez não neste momento, já que o dólar não está na melhor cotação). Entretanto, acho que muitas decisões de compra ainda são feitas baseadas na empolgação, na oportunidade de momento e na questão de comprar “só porque está barato”. Óbvio que temos necessidades, e ninguém está aqui para negá-las. Mas será que todas essas compras realmente vêm de um lugar de necessidade, no sentido mais literal da palavra? Soma-se a isso a grande valorização à marca e não necessariamente ao produto. Lembro de uma vez ver uma recomendação da Uniqlo (marca japonesa que é referência em roupas de inverno) para compra de casaco e ver alguém alertando para o fato de que na Uniqlo você não encontra nada da Michael Kors ou afins – e isso seria uma desvantagem. Então, analisando assim, estamos realmente nos apegando à necessidade ou ao status de uma marca? Nesse caso, não dá pra negar que há quem vá sempre preferir as “marcas” conhecidas –  não necessariamente porque elas têm mais qualidade, mas sim pelo poder que elas representam. E aí entra a comoção com a Century 21. Ela representava o acesso a muitas marcas que são sinônimo de status na nossa sociedade.

Mas, a gente pode tirar algumas conclusões e reflexões sobre esse episódio da Century 21. Primeiro, que a mudança para não deixar uma marca definir quem somos começa por nós mesmos. Não estou negando que é bom ter uma roupa legal, uma bolsa descolada, um tênis bonito. Mas o quanto abrimos mão de qualidade só para por conta de nome? A gente está realmente preocupado com o material de uma camiseta ou somente com a etiqueta? A gente tá preocupado com o quão versátil vai ser uma bolsa ou somente com o logo estampado nela? Hoje, quando eu procuro um produto, seja um tênis para malhar ou uma calça jeans que me vista bem, o que define a minha escolha final não é necessariamente a marca. São vários fatores, dentre eles, a qualidade do item. Se calhar de nas minhas pesquisas o melhor tênis ser o da Nike, ok, mas o que me fez escolher tal tênis não foi puramente o fato de ele ser da Nike. Tem muita coisa que a gente paga barato para durar pouco também – e nem se dá conta de que, no fim das contas, aquele item acabou saindo caro pelo número de vezes que foi usado. O que é mais caro? Uma camiseta de U$10 que dura dois meses ou uma camiseta de U$35 que dura um ano?

Outra coisa que também faz eu virar fã de marcas é conhecer suas propostas sociais e ambientais – afinal, o mercado da moda é um mercado que causa um enorme desperdício de tecidos e altas emissões de carbono. Sem contar as inúmeras denúncias que já rolaram em relação à contratação de trabalho escravo. É óbvio que você pode pensar – e não te culpo por isso – que no fim das contas todas elas querem ganhar dinheiro. Óbvio. Capitalismo é isso aí mesmo e boletos precisam ser pagos. Mas a gente não pode subestimar nosso poder como consumidor e onde decidimos colocar nosso dinheiro. Compras também podem envolver causas. No momento em que vivemos, é importante conhecermos os processos por trás e os valores por trás. Será que dá, por exemplo, para apoiar marcas com histórico de racismo? Não é mais bacana saber que parte do dinheiro da compra daquele produto vai auxiliar alguma organização? Ou apoiar marcas e empresas que tentam fazer a diferença no mundo? Ou marcas que trazem diversidade às suas campanhas publicitárias ao invés de perpetuar o padrão estético inalcançável? Eu adoro conhecer marcas de Nova York, marcas de mulheres, marcas de imigrantes. Eu gosto de pensar que posso fazer a diferença tentando distribuir mais para onde vai o meu dinheiro. Nem sempre eu consigo. Minhas compras não são 100% nobres. Mas eu tento.

Esse episódio da Century também pode ser um convite pra abrir os olhos para uma outra Nova York, seja dando chance para os brechós, para as feirinhas de artesanato locais, para lojas e marcas independentes. De deixar a resistência de lado, expandir seu horizonte e suas possibilidades de escolha. Compras conscientes sempre podem significar mais dinheiro sobrando para experiências e outras viagens. E lembre que o que vai criar as melhores e mais duradouras memórias da sua viagem para essa cidade incrível não são as coisas que você vai comprar, mas os momentos que vai vivenciar, os cheiros que vai sentir e as belezas que seus olhos vão ver.

Uma dica: Se você sentir falta da Century 21, Nova York continua tendo opções similares como a Nordstrom Rack, Tj Maxx, Marshalls e Saks Off Fifth.

Alguns conteúdos para complementar a reflexão

Nesse episódio, damos nossa opinião sobre esse evento de consumo tão famoso nos EUA e quanto o FOMO – fear of missing out (medo de estar perdendo alguma coisa) – pode influenciar na sua decisão de compra. Além disso, também falamos sobre nossos critérios de compra e como mudamos nosso pensamento em relação a preço e valor, quantidade e qualidade. Por fim, também damos um panorama geral sobre a diferença na valorização dos serviços aqui e no Brasil. É um bate-papo, digamos, profundo e eu prometo que tá bem interessante!

Viagens são ótimas oportunidades para compras: para encontrar itens diferenciados e também mais baratos. Mas será que a gente precisa sempre não deixar passar a oportunidade só por conta do preço? Neste vídeo, eu e a Fernanda Neute expusemos nossas opiniões a respeito do assunto e damos dicas sobre como fazer compras mais inteligentes e dar o devido valor ao seu dinheiro, sem acumular coisas desnecessárias.

E mais:

  • Como causar um impacto positivo como turista em Nova Yorko tempo em que as pessoas não questionam suas escolhas e o impacto delas precisa ficar para trás. Precisamos refletir mais sobre nossas ações – no lugar onde moramos e no lugar que visitamos. Mesmo que você não tenha direito ao voto, há várias formas de fazer a diferença e impactar o lugar que visita. Confira agumas reflexões e sugestões de ações que podem ser tomadas quando se visita Nova York.
  • 5 lojas em Nova York para você comprar com mais consciência – Sustentabilidade e consumo consciente não são só “termos da moda” mas sim práticas que estão se fortalecendo todos os dias e que todos deveríamos adotar. Cada vez mais, surgem marcas e lojas com uma pegada diferente – não é só sobre comprar, mas sobre o que você compra e de onde você compra, é sobre composição, sobre origens, sobre práticas. Nem sempre dá pra gente atender a todos os requisitos na hora de comprar consciente, mas se você quiser tentar, aí vão minhas sugestões de marcas e lojas em Nova York que têm essa pegada.

Documentário

Esse documentário do Netflix traz questionamentos importantes sobre essa nossa sociedade de consumo. Apesar de eu não concordar com absolutamente tudo, acho que convida a uma reflexão importante, faz questionamentos necessários e faz a gente pensar sobre toda essa questão de propaganda, necessidades criadas, compras e tudo mais!


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