Blog da Laura Peruchi – Tudo sobre Nova York
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Como causar um impacto positivo como turista em Nova York

Do ano passado para cá, por conta de documentários a que assisti e também pelo momento de pausa que a pandemia trouxe para mim (sei que não foi assim para todo mundo), eu comecei a refletir muito sobre meu papel morando em Nova York. Eu sei que meu trabalho ajuda muita gente, mas  me peguei refletindo mais sobre a minha existência aqui como moradora da cidade. A gente dispensa bastante tempo criando conexões com a família e amigos no Brasil, consumindo aqueles produtos brasileiros, até assistindo a canais brasileiros, acabamos nos envolvendo com problemas no Brasil. Mas, como imigrante, como você se integra ao lugar onde mora? Até essa pandemia acontecer, por exemplo, eu não sabia nem quem era o governador de NY e não conhecia o rosto do prefeito da cidade. Acho que quando moramos fora é, também, nosso dever nos inteirarmos sobre o cenário do lugar onde moramos.

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No dia em que escrevo este post, protestos tomam conta de várias cidades nos Estados Unidos, incluindo Nova York, por conta do assassinato brutal de George Floyd, em Minneapolis. Sua morte foi só mais um reflexo do racismo que existe neste país – e que muitos insistem em ignorar. O racismo é apenas um dos problemas sociais que existem aqui – há também a questão dos imigrantes indocumentados, a luta LGBTQ, enfim. Como criadora de conteúdo de Nova York há mais de seis anos, eu comecei a pensar em como poderia aproveitar este momento para trazer uma reflexão para a minha audiência, que é, em sua maioria, composta por turistas brasileiros que visitam a cidade. Fiquei refletindo sobre boas práticas que um turista pode tomar para causar o melhor impacto em Nova York. Pequenas ações fazem a diferença!

O turismo é, sem dúvida, uma indústria que movimenta milhões de dólares. Por conta disso, o turista tem, sim, um papel importante, mas vejo que, muitas vezes, esse mesmo turista assume apenas o papel passivo e de vantagem, como alguém que se coloca em um lugar de muita importância – “eles precisam do meu dinheiro”- sem lembrar que ele também tem um impacto no lugar que está visitando. Acho que o tempo em que as pessoas não questionam suas escolhas e o impacto delas precisa ficar para trás. Precisamos refletir mais sobre nossas ações – no lugar onde moramos e no lugar que visitamos. Mesmo que você não tenha direito ao voto, há várias formas de fazer a diferença e impactar o lugar que visita. A seguir, algumas reflexões e sugestões de ações que podem ser tomadas quando se visita Nova York:

  • Cuidado com falas racistas –  acredito que, no contexto histórico que vivemos, esse precisava ser o primeiro tópico. Acho que em mais de 90% das vezes em que eu citei o Harlem ou o The Bronx em alguma oportunidade, sempre li o seguinte comentário: mas, não é perigoso? O mesmo turista que se preocupa com a segurança nesses locais jamais questionou sua segurança na Times Square – que é, disparado, o lugar com mais furtos em Manhattan. Quem conhece o mínimo sobre Nova York sabe que a população negra é maioria no Harlem e no The Bronx.  Eu gosto muito de compartilhar este mapa do crime na cidade – clique aqui para acessar. Você pode filtrar por tipo de crime – estupro, roubo, assalto, assassinato – e por período. Ele divide a cidade em grandes bairros e ilustra o número de crimes em tais bairros por cada mil habitantes. Quanto mais forte a cor, maior o número de ocorrências.  Sim, é duro assumir preconceito, mas, em muitos casos, é ele que disfarça esse “medo” muitas vezes infundado. É fato: não dá mais para generalizar um bairro inteiro. É quase impossível falar para evitar determinada área principalmente sem conhecer e só repetir o que outros dizem. Muita gente fala do The Bronx ou do Harlem sem nunca terem colocado os pés perto ou se interessado em conhecer melhor. Veja bem: eu não estou dizendo que não existem áreas mais perigosas no The Bronx – mas elas existem também no Queens e no Brooklyn.  Então, não perpetue essas falas. Pesquise, leia, informe-se. E mais: seja o agente da mudança. Se você visitar esses locais historicamente marcados por preconceito e racismo, não seja mais uma pessoa a espalhar esse sentimento. Não saia fazendo comentários de que “recebeu olhares estranhos”. Propague o que você viu de bom e não alimente algo que provavelmente parte de um pré-julgamento seu. Quando algo nos incomoda, é importante que gente se questione sobre os motivos pelos quais aquilo nos incomoda

Leia também: Nova York é uma cidade segura? Tudo que você precisa saber

  • Respeite a cultura negra de NYC – muita gente vem para Nova York e tem vontade de ir a culto gospel, seja no Harlem ou na Brooklyn Tabernacle. Muitas igrejas acabaram criando regras de comportamento – desde ao dress code, passando pela proibição de filmagem. Se você frequentar um culto desses, seja respeitoso. Se as regras foram criadas, é porque, no passado, certamente teve turista tratando o evento como um espetáculo turístico, quando se tratam de celebrações religiosas de um povo local que não é obrigado a ver sua cultura ser alvo de espetacularização. Respeite, não filme se não pode filmar e deixe uma contribuição para a instituição.

  • Pare de questionar e pague a gorjeta – acredito que, enquanto eu criar conteúdo sobre Nova York, vou me deparar com pessoas questionando a cultura da gorjeta. Entendo que isso não faz parte da vida de muita gente, e é por isso que se deve ler e se informar. Você é quem está visitando a cidade – então, você é quem deve se adaptar às regras do local que está visitando. Quem será que está em posição mais privilegiada: a pessoa que compra uma passagem aérea, paga hospedagem numa das cidades mais caras do mundo e compra uma moeda que custa cinco vezes mais que a sua moeda local, ou o trabalhador que serve num restaurante? Ninguém está falando que os seus esforços não valem nada. Entretanto, pense: por mais que você não tenha todo o dinheiro do mundo, você é, sim, um privilegiado, ao vir fazer turismo em Nova York. Você não concorda com o sistema, ótimo, mas não pagar só prejudica a parte menos privilegiada da equação. E sabe quem são as pessoas que dependem de gorjetas? As minorias, geralmente: negros, imigrantes, mulheres. Nos EUA, 4,4 milhões de trabalhadores dependem de gorjetas para ganhar a vida, dois terços deles mulheres. Será mesmo justo você, que vem de fora, que não mora aqui, querer se negar a pagar a gorjeta? Será que tem esse direito? E como eu sempre digo: você tem escolha: é só ir a outros locais para comer. Preveja o gasto da gorjeta no seu orçamento.

Aprenda mais sobre isso e escute este podcast: A polêmica da gorjeta – o outro lado da história

  • Repense a forma como você consome – e isso envolve os restaurantes e as lojas. Veja bem, eu não estou dizendo que você não pode comer no Hard Rock Cafe se tem vontade, ou que não pode comprar aquele tênis da Nike que você tanto queria. Mas, se me couber uma sugestão, inclua também restaurantes locais no seu roteiro – aqui no blog mesmo eu dou tanta dica de restaurante! Você também pode se informar sobre os donos desses restaurantes: são negros? São imigrantes? Já pensou que legal apoiar negócios assim? Que tal trocar o café no Starbucks por um café local? Quanto às compras, valorize as opções não tão óbvias. Que tal comprar em feiras de produtores locais, como a Artists & Fleas? Ou até mesmo aquela arte de um artista de rua ao invés daquele souvenir da loja famosa?

  • Respeite e valorize os artistas locais – ao andar por Nova York – em suas ruas, parques e até mesmo nos metrôs –  a gente se depara com diversos artistas: músicos, dançarinos, poetas. Mas, lembre-se: esses artistas não estão ali para você garantir o seu clique ou story no Instagram. Não é para ser uma via de mão só, e o artista não faz apenas por amor. Por isso, seja generoso e não esqueça de deixar uma contribuição.

  • Seja generoso também com seus conterrâneos brasileiros – eu crio conteúdo sobre Nova York há muito tempo e sei o quanto  meu trabalho já facilitou a vida de muitos turistas. Não vou fingir falsa modéstia: eu sei por que as pessoas me escrevem para falar que se não fosse por um vídeo ou post meu, não saberiam de alguma coisa que foi essencial para a viagem delas. Por isso, eu reforço: apoiem o trabalho de criadores de conteúdo como eu. Seja adquirindo um dos meus e-books, seja comprando pelo menos um ingresso pela loja do blog. Essa é uma maneira de ajudar um pequeno negócio – grandes sites e agências de viagem não precisam tanto da sua compra como um micro negócio como o meu. Se você acompanha outros criadores de conteúdo, faça o mesmo: veja como pode apoiar o trabalho deles.  Vá além: se precisar de um serviço como motorista, roteiro, guia: procure profissionais brasileiros. Se cabe no seu orçamento, contrate-os. Digo mais: respeite também os preços praticados por esses mesmos profissionais. Pesquise, veja o que cabe em seu bolso, mas não faça comparações com concorrentes. Cada um sabe das dificuldades que teve para chegar onde chegou.

Eu sei que, durante esses anos escrevendo sobre Nova York, ajudei a desconstruir muitas visões, e se esse post ajudar pelo menos uma pessoa a refletir mais sobre seu papel como turista, eu já fico feliz. Acho que o mínimo que posso fazer é usar minha plataforma para compartilhar esse aprendizado.

Além disso, com o número de informações disponíveis na internet hoje, fica cada vez mais fácil descobrir maneiras de causar o melhor impacto no lugar que visitamos! Esses exemplos levam em conta a minha experiência e conhecimento em relação a Nova York, mas acho que vários deles podem ser aplicados a qualquer lugar. Seja um turista consciente: vá além das compras e passeios e procure descobrir outras facetas do local que você está visitando. Pequenas mudanças e ações importam, sim!

PS: Não é meu lugar de fala, por isso fico à disposição também para acrescentar qualquer outra contribuição sobre o tema racismo aos dois primeiros tópicos.


2 Comentários

  1. Sensacional a maneira como escreve e se dedica ao blog! Esse texto sobre o impacto do turista é muito relevante.. eu adorei! Quando fui a NY fiquei no Harlem, e adorei.. fui em cafés locais, andei de metro por todos os lados.. Eu amo NY! Obrigada pelo seu trabalho!

  2. Excelente texto! Muito válidas suas colocações, realmente temos que pensar em como podemos levar um impacto positivo nos locais que visitamos, que vai muito além do dinheiro que gastamos!

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